O filme Anora, dirigido por Sean Baker, explora as nuances das relações afetivas em um contexto contemporâneo de desconexão. A história acompanha Anora, uma jovem stripper que se casa com o filho de uma família russa conservadora, enfrentando imediatamente a rejeição dos pais dele, que não a aceitam devido à sua origem e ocupação.
Logo nos primeiros minutos somos apresentados a Anora em seu ambiente de trabalho, onde ela parece navegar com naturalidade, mas à medida que a narrativa se desenrola, é revelado que sua vida é marcada por constantes relações sem afeto, em um cenário de distanciamentos emocionais.
Sean Baker, ao construir a narrativa de Anora, cria uma aparente neutralidade que desorienta o espectador. A sensação inicial de que o filme não toma partido ou não revela explicitamente as intenções do diretor é, na verdade, um artifício engenhoso que convida o público a ocupar um lugar ativo na interpretação. Em vez de fornecer respostas prontas, Baker constrói uma narrativa aberta, onde os personagens e suas interações se desenvolvem sem julgamentos evidentes, permitindo que os espectadores experimentem o universo do filme como se fossem parte dele. Essa escolha estilística não é apenas uma questão de técnica, mas uma lógica que vai na contramão da forma como consumimos e interpretamos a arte nos dias de hoje.
Esse aparente narrar acrítico também atua como uma camada adicional de imersão, na qual o espectador não encontra facilmente um ponto de apoio. Não há um "herói" ou "vilão" claramente definido, e as motivações dos personagens não são entregues de forma direta. No universo de Baker, a ausência de respostas claras não é um defeito, mas uma forma de evidenciar o caos das conexões emocionais e a dificuldade de estabelecer diálogos mais objetivos. Esse caos frequentemente é negligenciado em narrativas mais convencionais, que criam relações simples, diretas e, na maioria das vezes, sem nenhum conexão com o que de fato os personagens estão sentido.
No filme, embora tudo é representado com a naturalidade que aquele universo é responsável, mas soa como artificial aos olhos de quem percebe o que está por detrás daquele jogo de cena. Com um pouco mais de atenção, entendemos que é muito difícil que aquela situação toda possa ir além de um mero divertimento de um homem adulto que age como se fosse uma criança sem nenhuma responsabilidade.
A relação entre Anora e esse garoto é construída em um equilíbrio precário, onde interesses financeiros e afetivos se misturam. Enquanto Anora acredita na legitimidade de seus sentimentos, o público percebe que seu marido enxerga a relação como algo funcional e vantajoso para si mesmo - algo momentaneo e fugaz. Baker conduz essa dinâmica sem julgamentos explícitos, mas deixa claras as tensões que permeiam a convivência do casal, revelando como as relações humanas podem ser moldadas por interesses. Essa complexidade é central para a narrativa e reflete de maneira sutil como o contexto social pode influenciar as nossas expectativas com relação ao nosso universo afetivo.
Baker utiliza essa abordagem para questionar as estruturas que sustentam essas dinâmicas, mas sem recorrer a uma crítica direta ou panfletária, permitindo que o espectador tire suas próprias conclusões. O que é uma verdadeira relação? O que realmente é necessário para construir laços duradous?